É CONSTITUCIONAL LEI DE ENTE FEDERADO QUE DISCIPLINA NORMA ESPECÍFICA DE LICITAÇÃO EXIGINDO DETERMINADA LICENÇA DE FUNCIONAMENTO NO MOMENTO DA HABILITAÇÃO PARA PARTICIPAR DO CERTAME
Publicou no Diário Oficial da União decisão de mérito ( DOU de 01.10.2024, nº 190, Seção 1, p. 01) do Colendo Tribunal Constitucional, por unanimidade, que julgou improcedente o pedido formulado na ADI 3983, Rel. Ministro Nunes Marques, pelo Governador do Distrito Federal, nos termos do voto do Relator.
O tema envolve art. 1º, § 2º, da Lei n. 3.978, de 29 de março de 2007, do Distrito Federal, que prevê a exigibilidade de apresentação, no momento da habilitação para participar de licitação pública cujo objeto seja a execução de atividades dedicadas ao combate a insetos e roedores, à limpeza e higienização de reservatórios de água e à manipulação de produtos químicos para limpeza e conservação, de licença de funcionamento expedida pelo órgão responsável pela vigilância sanitária no âmbito distrital.
Para maior documentação, vejamos a norma em questão:
“Art. 1º. […]
§ 2º A licença de Funcionamento de que trata este artigo deverá ser renovada anualmente e exigível na habilitação para participação em licitação pública, quando se tratar da contratação dos serviços de que trata este artigo”.
O Governador do DF suscitou que a norma objeto da ADI violaria a competência privativa da União para editar normas gerais de licitação e contratação (CF, art. 22, XXVII), bem como não caber à unidade federativa aditar norma geral veiculada em lei federal que especifica os documentos necessários à qualificação jurídica e técnica no procedimento licitatório.
O Poder Legislativo do Distrito Federal frisou em sua resposta ao questionamento da ação que a competência dos Estados e do Distrito Federal para estabelecer normas específicas em matéria de licitações e contratos, independentemente de autorização por meio de lei complementar nacional, é antiga, legal e não possui controvérsia.
Suscita, ainda, não houve aditamento das normas gerais constantes de lei federal, mas regulamentação de peculiaridade local. E mais. Não existi ofensa à isonomia, na medida em que o ato inquinado teria por finalidade resguardar a segurança nas contratações efetuadas pelo poder público distrital.
O pedido foi julgado improcedente.
Vejamos a ementa da decisão:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. SISTEMA DE REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS. ALEGAÇÃO DE USURPAÇÃO DA ATRIBUIÇÃO NORMATIVA DA UNIÃO. CONFRONTO DO DISPOSITIVO IMPUGNADO DIRETAMENTE COM O TEXTO CONSTITUCIONAL. CONHECIMENTO DA AÇÃO. LEI N. 3.978/2007 DO DISTRITO FEDERAL. LICENÇA PARA FUNCIONAMENTO DOS ESTABELECIMENTOS QUE EXECUTAM ATIVIDADES DEDICADAS AO COMBATE A INSETOS E ROEDORES, LIMPEZA E HIGIENIZAÇÃO DE RESERVATÓRIOS DE ÁGUA, BEM COMO MANIPULAÇÃO DE PRODUTOS QUÍMICOS PARA LIMPEZA E CONSERVAÇÃO. EXIGÊNCIA NA HABILITAÇÃO TÉCNICA PARA PARTICIPAÇÃO EM LICITAÇÃO PÚBLICA. NORMA ESPECÍFICA. INTERESSE LOCAL. ATIVIDADE E OBJETO DETERMINADOS. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA SUPLEMENTAR DO DISTRITO FEDERAL. OBSERVÂNCIA DO INTERESSE PÚBLICO. PROTEÇÃO DA VIDA E SAÚDE HUMANAS. HARMONIA COM A REGULAMENTAÇÃO FEDERAL. FALTA DE CORRELAÇÃO COM A NORMATIZAÇÃO DO EXERCÍCIO DE PROFISSÕES. AUSÊNCIA DE OFENSA À IMPESSOALIDADE E À ISONOMIA.
1. A articulação de usurpação da competência legislativa da União invocada
envolve o cotejo da norma questionada com o Texto Constitucional, o que afasta a alegação
de ofensa reflexa. Precedentes.
2. Compete privativamente à União editar lei versando normas gerais de licitação e
contratação públicas (CF, art. 21, XXVII), cabendo ao direito estadual, distrital e municipal, no exercício da atribuição normativa suplementar (CF, arts. 25, § 1º; 30, I e II; e 32, § 1º), apenas fixar preceitos específicos, relacionados a uma classe de objetos a serem contratados ou a circunstâncias particulares de interesse local.
3. A Lei n. 3.978, de 29 de março de 2007, do Distrito Federal, ao exigir a apresentação de licença de funcionamento na habilitação para participar de licitação pública voltada à contratação de serviços de combate a insetos e roedores, limpeza e higienização de reservatórios de água, bem como manipulação de produtos químicos para limpeza e
conservação, revela norma específica, focada no interesse regional, relacionada a objeto
determinado e atividade específica, não discrepante dos princípios e diretrizes preconizados na legislação federal de regência tanto a Lei n. 8.666/1993 quanto a de n. 14.133/2021 e
direcionada ao cumprimento do interesse público e à proteção de direitos constitucionais,
como a vida e saúde.
4. A disposição impugnada visa à proteção do interesse público e da vida e saúde humanas, não apresentando correlação com a normatização de condições para o exercício de profissões, cuja atribuição normativa é reservada à União (CF, art. 22, XVI).
5. A exigibilidade de apresentação de licença de funcionamento prevista no art. 2º, § 1º, da Lei n. 3.978/2007 do Distrito Federal não constitui discrímen desarrazoado ou injustificável, porquanto não afeta a competitividade desejada. Antes, consiste em mecanismo de controle administrativo fundamentado no dever constitucional imposto a todos os poderes públicos de promover a saúde pública e no direito subjetivo constitucional à saúde, garantido mediante políticas sociais e econômicas hábeis a reduzir o risco de doença e outros agravos (CF, art. 196, caput). Ausente ofensa à impessoalidade na Administração Pública e à isonomia entre os licitantes.
6. Pedido julgado improcedente.