CAMINHO JURÍDICO OBRIGATÓRIO, SEM FAVORISTIMO OU EXCLUSÃO, NA REALIZAÇÃO DE UMA ESTERILIZAÇÃO VOLUNTÁRIA MASCULINA (VASECTOMIA).
Na semana passada recebi uma consulta no seguinte teor: se um homem jovem, recém-casado e sem filhos poderia realizar uma esterilização voluntária apenas com um laudo de seu médico assistente e sem a concordância expressa de seu cônjuge.
O desejo de não ter filhos, ou o medo de tê-los com problemas, é um caminho livre para qualquer ser humano.
Na verdade, há caminhos, os mais diversos, tanto que existem consequências, as mais diferentes. E se as estradas desta decisão, sejam quais sejam, expressam-se por várias opções cabe de antemão conhecer o cenário jurídico regulatório no intuito de evitar desgastes e decepções no futuro.
É palpável perceber que se temos caminhos agrestes a percorrer, nas vastidões da caminhada humana, é sempre bom conhecer eventuais dificuldades de esse caminhar.
À vista do acima dito, ofertando-te, pois, este artigo, despretensioso, ao amigo visitante de nossa página, nada mais fazemos nós, os Advogados, que reunir lembrete de proveito à opção de cada um, através do que consta na legislação.
Assim, nosso intuito à frente de desafios pessoais ou não é oferecer que todos tenham em mãos as informações necessárias para dissipar eventual encruzilhada e nevoeiro que, não raras vezes, induzem à dificuldade ou à indecisão.
Portanto, vejamos, então, neste breve texto, os passos obrigatórios que somos levados a caminhar na inevitável trilha jurídica da vida evitando, assim, desgastes desnecessários sobre o tema deste artigo.
A Lei Federal nº 9.263, 12.01.1996, no seu art. 10, caput, inciso I e II, e §§, assim determina:
“ Art. 10. Somente é permitida a esterilização voluntária nas seguintes situações:
I – em homens e mulheres com capacidade civil plena e maiores de vinte e cinco anos de idade ou, pelo menos, com dois filhos vivos, desde que observado o prazo mínimo de sessenta dias entre a manifestação da vontade e o ato cirúrgico, período no qual será propiciado à pessoa interessada acesso a serviço de regulação da fecundidade, incluindo aconselhamento por equipe multidisciplinar, visando desencorajar a esterilização precoce;
II – risco à vida ou à saúde da mulher ou do futuro concepto, testemunhado em relatório escrito e assinado por dois médicos.
§ 1º É condição para que se realize a esterilização o registro de expressa manifestação da vontade em documento escrito e firmado, após a informação a respeito dos riscos da cirurgia, possíveis efeitos colaterais, dificuldades de sua reversão e opções de contracepção reversíveis existentes. (…)
§ 5º Na vigência de sociedade conjugal, a esterilização depende do consentimento expresso de ambos os cônjuges.”
Fê-lo com bastante propriedade o legislador federal em definir o norte da legislação de planejamento familiar brasileira, bem como os conceitos, requisitos, finalidades, métodos e assistência sobre planejamento familiar.
E mais. A lei exige que o risco à saúde do futuro concepto seja subscrito por 2(dois) médicos, requisito legal que não exige maiores interpretações.
Ou seja, dentre os inúmeros requisitos previstos na lei federal acima referida à manifestação de vontade a que se refere o inciso I é muito clara e não deixa qualquer dúvida no sentido de que esta manifestação deva ser feita por documento escrito e devidamente firmado (art. 10, inc.I c/c § 1º).
E mais. Quando a pessoa que deseja se submeter à esterilização voluntária for casado o prosseguimento desta solicitação somente terá validade se o cônjuge expressamente consentir (art. 10, § 5º).
Avulta, assim, ineludivelmente cristalino que o primeiro aspecto a ser observado é que somente é permitida a esterilização voluntária quando existir uma declaração expressa do interessado e seu cônjuge, além de 2(duas) opiniões médicas.
Aliás, no art. 1.565, § 2º do Código Civil está assim previsto:
“o planejamento familiar é de livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e financeiros para o exercício desse direito, vedado qualquer tipo de coerção por parte de instituições privadas ou públicas”.
Este mandamento reforça o que consta do §7º do art. 226 da Constituição e reafirma que o direito à reprodução deve ser livremente deliberado pelas pessoas e casais, cabendo ao Estado regulamentar o tema..
Ademais, nunca é demais rememorar que o Novo Código de Ética Médica (Resolução CFM nº 2217, de 27 de setembro de 2018), aborda este assunto no artigo 15. O antigo Código – Resolução CFM 1931/2009 – abordava esta questão nos arts. 42, 43 e 46:
Código de Ética Médica
(Resolução CFM nº 2217, de 27 de setembro de 2018
“Capítulo III – RESPONSABILIDADE PROFISSIONAL
É vedado ao médico:
(…)
Art. 15. Descumprir legislação específica nos casos de transplantes de órgãos ou de tecidos, esterilização, fecundação artificial, abortamento, manipulação ou terapia genética.” Grifamos.
Visto, com olhos de ver, não se esboça, repita-se, à exaustão, a mais tênue linha de juridicidade na pretensão de quem quer que seja, sem favoritismo ou exclusão, de submeter à esterilização voluntária sem observar o acima exposto.
Não obstante a alegação de eventual urgência constante dos pedidos neste sentido, não há como perquirir eventual urgência sobre a real necessidade sem amplo debate de, no mínimo, 2(dois) médicos.
Pois bem. Caberia a concessão de uma liminar judicial com base apenas no parecer favorável de 1(um) médico assistente, mais declaração expressa do interessado na esterilização voluntária?
Evidente que não existe base jurídica para tal autorização judicial até porque não pode o juiz decidir contra a lei. Ora, se a lei determina uma determinada forma para prática de um ato como, por exemplo, “declaração expressa de concordância de ambos os cônjuges” não pode eventual interessado querer compelir o Poder Judiciário a emitir uma decisão contra disposição normativa expressa.
Sobre este tema, é importante observar o que dispõe o CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA na Resolução Nº 1.901/ 2009:
“Estabelece normas éticas para a esterilização cirúrgica masculina
(…)
Art. 1º A esterilização masculina é um conjunto de ações complexas das quais o ato médico-cirúrgico de ligadura bilateral dos canais deferentes é apenas uma das etapas.
Art. 2º O procedimento cirúrgico de esterilização masculina pode ser realizado apenas em pacientes com capacidade civil plena, de acordo com o previsto na Lei nº 9.263/96 de 12 de Janeiro de 1996 e somente 60 (sessenta) dias depois da manifestação de vontade.
Art. 3º A manifestação de vontade, bem como o procedimento realizado, devem estar devidamente registrados em prontuários.
Art. 4º O médico que se propõe a realizar um procedimento de esterilização masculina, deve estar habilitado para proceder a sua reversão.
Art. 5º Esta resolução entra em vigor a partir da data de sua publicação.” G.N.
Portanto, a pretensão de quem quer que seja de ser submetido a uma esterilização voluntária masculina sem o cumprimento de requistos previstos expressamente em lei federal sobre planejamento familiar não tem a mínima base legal para amparar qualquer solicitação nesse sentido.
Derradeiramente e diante de um caso prático, pode, por exemplo, um Plano de Saúde ou Hospital que recebeu a solicitação para esterilização negar a realização da esterilização voluntária masculina enquanto o solicitante não observar os requisitos legais já mencionados neste artigo.